O que é aprender





NELLY CARVALHO
(Professora do Deptº de Letras do UFPE - nellycar@terra. com. br)
Publicado em 11.02.2005

Segundo o dicionário, aprender é uma variante de apreender. Ambos significam assimilar mentalmente, compreender com profundidade, captar, adquirir conhecimento a partir de estudo ou de prática, de uma língua de uma técnica, de uma arte. Ë um processo que se dá por convivência com o objeto a ser apreendido e que modifica o aprendiz fazendo-o crescer como pessoa, quando o tema do aprendizado é relevante e positivo.
Foram reflexões que nos vieram à mente ao levar os netos para ver a exposição dos chamados Quadrões de Maurício de Souza no IRB.
Todas aquelas crianças, vindas das mais diversas escolas e condições sociais, olhando e comparando o original e a cópia, com seus personagens favoritos, já conhecidos nos quadrinhos, sofrem a influência da arte e se deixam marcar pelo bom gosto. As explicações ao lado conduzem a compreensão do que seja o motivo da pintura. e nenhum daqueles garotos esquecerá a experiência visual que levarão pela vida afora,
Quando viajamos pela Europa, ficamos encantados por ver os colegiais, visitando museus e coleções em visitas guiadas por professores. Compreendemos então o motivo de terem os europeus um nível e um interesse cultural muito superior ao nosso. É na infância que se forma o gosto artístico e se desperta interesse pela cultura pela história do seu país. E com isso se forma o cidadão, com consciência de suas raízes.
Agora, estamos tendo aqui esta oportunidade com uma instituição como o IRB que abre suas portas gratuitamente para instruir os cidadãos de hoje e de amanhã
E não é só a arte da pintura A edificação é uma lição de bom gosto e história. O castelo, com sua ponte levadiça, num belo parque verde, às margens de um lago de conto de fadas, onde deslizam cisnes brancos e negros, ensina às crianças que existe um mundo diferente do frenético e vertical em que vivem empoleirados.
Lembro o meu deslumbramento, quando ainda jovem, na Espanha, entrei no saguão de um castelo feudal, onde vi pela primeira vez armaduras de cavaleiros, com suas lanças e espadas. Tanto estudara sobre os cavaleiros medievais, nos textos do espanhol antigo, traduzindo El Cantar de Mio Cid e os romanceros, e do francês arcaico, as canções de Gesta e a Chanson de Roland, solidária com os sofrimentos de Carlos Magno pela morte injusta de seu sobrinho, que, me ver nesse ambiente, trouxe a emoção da certeza de sua existência remota. E agora, qualquer um que quiser visitar tudo isso é só ir até à Várzea e conhecer um mundo diferente, belo e real, embora remoto
Com a generosidade dos grandes senhores feudais, Ricardo Brennand abre seus domínios e permite o acesso a um bem cultural que creio ser o único no Brasil, contribuindo dessa forma para o aprendizado de uma comunidade e para o desenvolvimento dos saberes artístico e histórico.

O que é aprender ? É conviver com o belo, o significativo, o diferente, guardando-o como tesouro em nosso espírito.
Falar em aprender é lembrar os mestres. Assim, queria homenagear, agora, um grande mestre que se foi junto com o ano de 2004: professor Geraldo Lapenda.
Profundo conhecedor de línguas, ensinou-nos Latim e Italiano, no curso de Graduação em Letras Neo-latinas. Tinha uma didática tão perfeita que durante toda a vida, como professora de língua portuguesa, tentei imitá-lo, em vão. Ensinou-nos italiano, conseguindo que, em dois anos, já falássemos bem e transformou o estudo do Latim em algo interessante, através do texto das Metamorfoses de Ovídio, uma lenda explicativa das origens do mundo. Sabia muito e sabia mais : espanhol, francês, alemão, inglês, tupi e foi quem primeiro descreveu a língua dos índios fulniô de Águas Belas, o iathê. Tanto no Mestrado, como no Doutorado, ensinou Fonética e Fonologia, que são o nó da Lingüística e conseguia ser entendido, sabia fazer-nos aprender.
Mestres como Lapenda já se fazem raros pelo saber, pela grandeza de espírito e pela simplicidade.

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